Nossas decisões, reações e respostas sempre são baseadas na emoção que estamos sentindo ou na emoção que a situação nos provoca.
Entender e dar sentindo às nossas emoções é o que nos torna capazes de fazer escolhas que sustentam o nosso desenvolvimento.
Nós precisamos dos outros para aprender a gerir nossas emoções, desde os primeiros dias de vida compartilhamos nossas emoções através de olhares e mais tarde de sorrisos.
"O ser humano precisa de outro ser humano para ser um ser humano” - Do documentário “Em busca de um novo caminho”
É de extrema importância ser capaz de acessar as pessoas de forma efetiva e sociável quando estamos sentindo emoções que não entendemos ou que são muito intensas.
Como todas as crianças, autistas precisam aprender a tolerar emoções desconfortáveis (tédio, frustração, confusão, decepção, etc.) Todas as emoções são válidas e devem ser experimentadas.
A emoção mais motivadora para a criatividade humana é o tédio. Buscar entreter e distrair alguém constantemente é o mesmo que podar sua criatividade.
A única maneira das crianças aprenderem a tolerar suas emoções desconfortáveis que ocorrem no dia a dia é ter adultos capazes de tolerar estas emoções desconfortáveis. Os adultos devem ajudar as crianças permitindo-lhes sentir suas emoções e tentando não se sentirem compelidos a eliminar essas emoções desconfortáveis. Isso coloca muita pressão sobre o adulto e não é saudável orientar as crianças a apenas buscar e sentir suas emoções positivas.
Quatro pilares da comunicação emocional
1. O que se vê:Para existir uma co-regulação e compartilhamento emocional é impresindível que haja uma troca de olhar.
Muitas vezes, quando o contato ocular é trabalhado, a criança é instruída a olhar, ou fisicamente forçada a olhar, após esse olhar vem uma demanda colocada pelo adulto.
Para que o contato olhos nos olhos tenha a sua real função, é necessário que NÃO se force o olhar, mas que se estimule o olhar fazendo proveito de pausas a da co-relação mãos-olhos. O que a criança toca, atrai seu olhar.
Podemos nos aproveitar da relação de atenção mãos/olhos, o que a criança toca ela dirige seu olhar, por isso levar as mãos da criança ao SEU rosto atrai o olhar, Este olhar deve “mover o mundo da criança” de forma positiva!
A nossa expressão facial ao nos comunicarmos com a a criança é muito importante também, é comum que após o esforço da criança em se comunicar conosco a nossa resposta seja uma pergunta, o que coloca mais demanda e pode acabar desentimulando a criança a se comunicar de forma sociável, uma vez que um grito gera uma resposta mais rápida do adulto. Quando a nossa resposta é uma pergunta, a tendência é franzirmos as sombrancelhas, o que passa uma mensagem emocional de preocupação, o que confunde a criança, mesmo que nossa intenção seja positiva.
2. Tom de Voz:
Cuidado com a infantilização não intencional: Os bebês necessitam de um adulto para resolver problemas para eles. Quando evoluímos para crianças a comunicação e habilidades organizacionais crescem permitindo-nos uma melhor coordenação com as expectativas dos nossos cuidadores e de como orientá-los de forma eficaz para satisfazer as nossas necessidades emocionais.
A criança com autismo não guia seus cuidadores para evoluir em seu desenvolvimento, isso mantém seus cuidadores primários num estágio de infantilização da pessoa com autismo. Temos que trazer à consciência esta questão que é intuitiva na criação de crianças sem dificuldades de aprendizado social, para assim poder ajudar nossas crianças em seu desenvolvimento global.
Usar o tom de voz mais agudo, semelhante ao que utilizamos quando estimulamos um bebê mantém a expectativa das nossas crianças que eles serão eternamente ajudados e assim tomam menos responsabilidade por seus desenvolvimentos.
Usar um tom de voz de dar ordem sobrecarrega de expectativas as nossas crianças o que pode resultar em comportamentos de fuga ou luta.
Usar o tom de voz de guia, de “vamos fazer juntos”, decisivo e positivo dá o incentivo e suporte emocional para as nossas crianças se engajarem numa atividade que estimule seu desenvolvimento.
3. Toque:
Muitas vezes nossas crianças são conhecidas por terem aversão ou não gostarem de toque, PORÉM o que se percebe é que estas crianças são tocadas (seguradas pelo braço) sistematicamente para serem corrigidas, essas constantes correções é que criam a aversão ao toque.
O toque é crucial para o aprendizado, é nossa primeira forma de comunicação e troca emocional que acontece desde a vida intrauterina.
Para crianças aparentemente avessas ao toque, tente tocá-las de forma positiva, brincando, para elogiá-las.
Quando propor atividades e durante interações use e abuse de toques positivos, de cócegas, de carinho nas costas, nos ombros, nos braços.
Quando estiver dando instruções para a criança autista, seja individualmente, seja em grupo, mantenha algum tipo de toque com ela, encoste seu braço ou perna nela, os menores podem estar sentados no colo nas atividades de roda, ou bem junto ao lado da professora ou assistente.
4. Movimento:
Movimento intencional: Geralmente a pessoa com autismo passa parte do seu tempo movendo seu corpo sem propósito, o que não acontece com as pessoas de desenvolvimento típico. Este movimento sem propósito aumenta a ansiedade por gerar confusão.Quando o sistema motor se engaja em movimento intencional (com o auxílio do adulto ou por conta própria), ele estará mais calmo e mais propenso a iniciar a interações.
EVITE A CORREÇÃO: Tente NÃO perseguir as crianças para fazê-las cumprir a tarefa. Antecipe os seus padrões de fuga e tente estar “um passo à frente” delas.
Estereotipias:
São movimentos auto-regulatórios, geralmente com a finalidade de regular tédio, confusão ou alegria.
As estratégias auto-regulatórias devem ser substituídas por estratégias co-regulatórias (interações sociais).
Para conseguirmos usar as pessoas de forma que os relacionamentos possam dar suporte as questões naturais emocionais eminentes de todos os Seres Humanos precisamos ter ao menos uma habilidade básica social: acessar as pessoas! Saber chegar até elas por conforto, por informações que clareiem a nossa confusão e por amplificação da alegria.
O sistema emocional é altamente impactado pela na dificuldades em iniciar interações positivas com os outros. Muitas vezes, os autistas sentem suas emoções de forma muito forte. Isso ocorre porque eles não sabem como aproveitar reflexivamente um relacionamento para organizar e dar sentido a suas emoções naturais minuto-a-minuto. Guiar as crianças a compartilhar suas emoções com você é fundamental para o seu desenvolvimento. Olhar nos olhos uns dos outros e trocar o que você sente é uma das primeiras formas de compartilhar emoção. Outra é usar o toque para transmitir o que sentimos.
A melhor plataforma para começar a construir a capacidade de alguém iniciar interações é através de brincadeiras.
Brincar é um caminho poderoso para descobrir maneiras de ajudá-los a aprender a iniciar por mais/continuar a interação. Fique ciente da necessidade de equilibrar o ser previsível com ser excessivamente ritualista, ou seja, não faça a mesma brincadeira exatamente da mesma maneira todas as vezes. Equilibre um nível saudável de previsibilidade com um nível saudável de novidade dependendo da idade emocional da criança.
Para mais ideias sobre como estimular através de brincadeiras leia AT EASE Learning® e Intervenção Precoce.
NÃO se trabalha autonomia em uma criança que ainda não desenvolveu a habilidade de acessar as pessoas para ter suas necessidades atendidas, isso é pular as etapas do desenvolvimento e afundar a pessoa ainda mais no autismo.
“Aprender Independente” X “ensinar” X “aprender juntos”
Aprendizado independente NÃO pode ser ensinado. Aprendizado independente é algo que acontece quando oportunidades são criadas para proporcionar que a pessoa descubra como fazer coisas por ela mesma.
Ensinar é algo que os adultos fazem para as crianças dentro de uma estrutura guiada e com uma programação e objetivos específicos e premeditados.
Aprender juntos é o que acontece quando os cuidadores ficam no papel de “líderes” enquanto fazem a parceria com a pessoa para explorar, descobrir e compartilhar as emoções e experiências um com o outro.
O que mais nossas crianças necessitam é de aprender juntos, descobrir o outro como seu guia assim saírem da solidão, da angústia e da ansiedade de se sentirem os únicos responsáveis por eles mesmos.
Inclusão Escolar
O papel do mediador, professor e todos os adultos envolvidos na inclusão é primordial, as crianças irão aprender com eles o respeito aos que necessitam de mais apoio, compaixão e ações positivas.
Os adultos devem incentivar a interação entre as crianças, principalmente em momentos de brincadeiras livre, recreio, entrada e saída da escola, nessas situações acontecem as trocas sociais e é tão comum que sobrecarreguem o sistema das nossas crianças e eles passem a enfileirar objetos, balançar as mãos, girar, correr em círculos, ou qualquer outro comportamento que acaba isolando-os das oportunidades de trocas sociais. É nesse exato momento que o papel do adulto como mediador é mais importante. Buscar maneiras de engajar ou acalmar o sistema da pessoa com autismo, criar oportunidades para que ela possa desfrutar de relações sociais sem sobrecarregar seus sistemas, sem forçar muito além da zona de conforto, mas dar o suporte para ampliar esta zona de conforto um pouco de cada vez.
Falar ou não sobre o diagnóstico de determinado aluno?
Eu sou da premissa que quanto menos “asas para a imaginação” no que se refere a informação, melhor. Ou seja, falar abertamente sobre as características únicas do colega é o melhor caminho, ao meu ver.
Apenas rotular “ele(a) é autista” não resolve as dúvidas de quem convive e sacramenta uma característica imutável, explicar que todos somos diferentes, que temos interesses únicos, que algumas coisas que são fáceis para uns, pode ser super difícil para outros, e vice e versa. MAS, o mais importante é que todos aprendemos e precisamos uns dos outros.
Uma ideias de como abordar os colegas sobre autismo numa classe de 1o ano:
Explicar “Diferenças de Aprendizado" para a classe: diferenças entre as pessoas é tão comum quanto natural. Todas as crianças sabem que algo é diferente no colega com autismo. É legal ter uma conversa em grupo e chamar a atenção para os pontos fortes e fracos que existem dentro da classe. Por exemplo, você pode perguntar aos alunos: "Quem consegue amarrar seus próprios sapatos? " "Quem consegue andar de bicicleta sem rodinhas?", etc. Você pode apontar como somos todos diferentes e que todos nós aprendemos coisas em nosso próprio ritmo . Se praticarmos, todos nós podemos aprender a amarrar os sapatos ou aprender a andar de bicicleta.
Em seguida, fazer um ponto destacando como o aluno com autismo é bom em algumas coisas (seja específico, aponte uma habilidade que ele tem que as outras crianças não podem fazer indicando o quão inteligente ele é) e como outras coisas são difíceis para ele (seja específico; costumamos dizer algo como "é difícil para ele para fazer amigos"). Fale sobre como cada aluno pode ajudar uns aos outros e ao colega com autismo a aprender a ser amigos melhores. Explique que, às vezes, o colega vai precisar de sua ajuda e outras vezes a professora irá pedir-lhes para NÃO ajudá-lo para que ele possa aprender a fazer as coisas por conta própria.
Explore este tópico até satisfazer as dúvidas das crianças. Elas provavelmente vão ter perguntas. Valide seu pensamento e reformule todas as observações que estão enquadradas de forma negativa. As crianças não estão sendo más, elas simplesmente não sabem como falar sobre o que vêem. Por exemplo, uma criança pode dizer algo como: " O colega sempre coloca coisas na boca. É nojento!", você pode reproduzir com algo como,"Sim, é um pouco nojento. Ele coloca as coisas na boca porque ele fica um pouco nervoso, sozinho, com medo, às vezes colocar coisas na boca faz ele se sentir um pouco melhor. Talvez você possa ajudar o colega sorrindo para ele e dizer-lhe "nós estamos bem e nos divertindo ou eu posso ajudá-lo?" Ou apenas segurar a mão dele para ajudá-lo a se sentir seguro ou menos solitário.
Para crianças em idade pré-escolar há inúmeros livros que falam sobre diferenças como o ELMER - autor David McKee e o sensível livro que toca no tema autismo de André Neves, Tom.
É interessante levar a informação aos pais dos colegas também, porque crianças comentam seu dia em casa e comentam sobre os colegas, não há a necessidade de guardar segredo. Uma ideia de carta a ser usada pelas escolas, dirigida aos pais dos alunos:
"Caros pais,
Aqui na ESCOLA apreciamos que o seu filho tem interesses diferentes e estilo único de aprendizagem. Você já deve ter notado ou ouvido falar sobre CRIANÇA que está na classe do seu filho. Est(e)a menina(o) também têm interesses e estilos de aprendizagem únicos. Acreditamos que ter CRIANÇA na sala de aula cria oportunidades raras (não disponíveis em outras classes) para o seu filho em ampliar o seu desenvolvimento, especificamente a compaixão e a tolerância para com os outros, que são facilmente aprendidas em uma idade jovem. A compaixão e a tolerância são qualidades de desenvolvimento que irão ajudar seu filho a prosperar no mundo ao longo de suas vidas. Gostaríamos de agradecer a CRIANÇA e sua família por confiar em nós e permitir que ela(e) faça parte da nossa comunidade escolar. Acreditamos que esta será uma experiência valiosa para todos os envolvidos. Se você tiver alguma dúvida, por favor, não hesite em nos contactar."
Matéria do O Globo:" Mas é o preconceito que as mães e os autistas mais temem. Marie, mãe de Pedro, teve dificuldades para convencer a diretora da escola do filho de que era necessário explicar às crianças a síndrome. Conseguiu uma hora apenas na turma do filho. Na sala de aula, a segunda rodada de perguntas foi bem diferente da primeira, quando as crianças queriam entender por que o menino autista não gostava delas. Marie conta que os colegas de seu filho quiseram saber algo bem simples depois de entenderem o que era a síndrome: “como a gente pode ajudar o Pedro?”."
Conclusão: Interações lúdicas, compartilhamento de experiências e resolução de problemas em CONJUNTO são maneiras eficientes para trabalhar o desenvolvimento emocional das nossas crianças, seja qual for a gravidade do comprometimento no desenvolvimento, sempre há o que progredir, sempre há o que aprender e sempre podemos aprender MUITO com eles. O que mede a nossa alegria de viver é o quão competente nos sentimos no mundo!
Meu agradecimento especial às famílias envolvidas na imersão de fevereiro/março de 2014 por abrirem suas vidas, confiarem em mim e acreditarem que sempre há o que melhorar.
Meu agradecimento especial ao Eric Hamblen por multiplicar seu conhecimento, compaixão e esperança conosco de forma tão estimulante.
Leia também:
Comunicação: funções do Comportamento.
Questões Sensoriais
Emoções e Autismo
AT EASE Learning Model®
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